Uma
rápida imersão por vários textos do antropólogo escritor Claude Levis-Strauss em
função da obrigatoriedade de apresentação de um material de comprovação da
conclusão do curso de iniciação à antropologia na UFSCar, me surgiu alguns
questionamentos referente à magia.
Não
obtive contato com procedimentos mágicos além de práticas mágicas das religiões
de matrizes africanas no Brasil, destas a que se denomina como Umbanda ou, mais vulgarmente conhecida
como Macumba que, para amenizar o
impacto do fato de muitos dos que as criticam, também buscarem soluções mágicas
mediante incursão em rituais para obtenção de riqueza, sucesso
emocional/sentimental e cura de pequenas doenças, chamam-na também de benzimento. Porém, de formação religiosa
cristã, essas práticas são, no o meio social que frequento tabus intocáveis,
más, segundo a proposta de Levi-Strauss, onde a tríade assertiva está no fato
de haver consentimento por parte do xamã,
do indivíduo que procura a ação mágica e do público ou grupo social que
acredita no sucesso da prática miraculosa, destaco que há similaridades entre
essas práticas e as religiões cristãs, além de também encontrar pontos de
congruência nos procedimentos medicinais científicos, diferente, porém, na
questão de organização do significante e do significado.
Quanto
as práticas mágicas e medicinais: Como pode um acreditar, realizar atos mirabolantes de cura, sucesso profissional
e financeiro? Em fim: Há porventura, semelhanças entre as práticas miraculosas
de “terreiros de macumba”, pastores curandeiros
nos meios religiosos cristãos e a figura do médico na sociedade ocidental?
***
Durante
o debruço na bibliografia lembrei, após a narrativa dum procedimento miraculoso
no texto O feiticeiro e sua magia de
Claude Levi-Strauss, de um fato milagroso da Igreja Mundial do Poder de Deus na
figura xamãnica, do líder religioso
Valdomiro Santiago onde, após uma série de mimeses corpórea, uma garota de uns
dez ou doze anos, que não se locomovia por algum tempo, passou a andar, a
princípio com certa dificuldade, mas rapidamente saiu correndo. Além desse há
diversos testemunhos de pessoas que afirmam terem recebido dádivas miraculosas em
círculos religiosos cristãos. Interessante é que acontecem rapidamente e na
frente de muitas testemunhas.
Diferente
dos xamãs das religiões de matrizes
africanas e de nativos brasileiros, que também realizam práticas mágicas com
fins milagrosos, exceto as práticas das igrejas Internacional da Graça e da
Igreja Universal, sendo interessante salientar que o Bispo Macedo ter tido
experiências com práticas de religiões de matrizes africanas antes de sua
conversão e que a Igreja da Graça tenha se originado na igreja Universal, não
usam nenhum objeto mágico, a não ser seu próprio corpo que mescla gritos e
urros e uma partitura corporal que na maior parte das vezes, surtem resultados.
Não
há nenhum mecanismo que prove a fidelidade e seriedade do xamã, havendo, como também encontrado no autor que me refiro desde
o começo do texto, a grande possibilidade de fraudes, porém, mesmo que haja
fraudes, tacito é a realização do “milagre”. Não há outra forma de explicar tal
fenômeno, a não ser recorrer aos efeitos psicológicos que essas práticas surtem
nessa tríade, quase que aristotélica: xamã,
aspirante e público.
O xamã, primeiramente, acredita que o
fenômeno pode acontecer dessa forma materializa uma série de ações que leva
tanto o aspirante quanto o público a associação desses atos a uma escola de xamãs, ou seja, mediante os
urros e gritos pode-se associá-lo a um líder religioso das diversas
ramificações das igrejas cristãs; uma vestimenta típica, uma série de elementos
ingeridos durante um ritual e ervas para causar cheiros pode-se perceber uma
prática de Umbanda ou Candomblé.
O
aspirante à cura, vendo nesse sacerdote a possibilidade de alcance de dádivas,
mas só acredita e o busca em função da forma que esse xamã se apresenta para a sociedade
e seu grau de aceitação nesse meio social.
No
conflito desses dois atores, encontra-se um ponto de conflito ou instabilidade,
visto que, quando entra no ritual, o aspirante não possui a cura e o xamã, que além de gozar de todas as suas
habilidades naturais, ainda, principalmente para o censo comum e para o
aspirante, possui um poder divino e miraculoso, assim:
Xamã = 2Habilidades
Aspirante = - 2Habilidade
X(2h) +A(-2H) =
0
A
busca do aspirante é, por meio da habilidade milagrosa, alcançar a habilidade
natural, essa é a odisseia rumo à
estabilidade.
Durante
o conflito há o público, um coletivo de pessoas que, por meio da tradição xamãnica, acredita que haverá
efetivamente o milagre.
Essas
práticas são na verdade procedimentos psicossociais de saber e tradição
coletiva que, quando postos em contato, ativam um pensamento mágico coletivo
esse, com procedimentos não científicos, porém, como na ciência, há uma margem
de erros, mas possuem também acertos, materializam o metafísico na matéria
física.
Assim,
sem fazer juízo de valor, questiona-se o “há
acertos!”, “mas como?”.
Esse
acreditar que há, tanto nas civilizações tidas como primitivas quanto nos povos
civilizados, engloba o pensamento
selvagem. Mas, enfim, o maior questionamento, é como pode um mesmo
mecanismo ou máquina de pensamento, desenvolver mecanismos ou estruturas de
pensamentos tão diferentes e que, fazem indivíduos de diferentes sociedades acreditarem em diferentes coisas e esse
tal acreditar, faz existir, mesmo que existam num campo
limitado, ou seja, num saber coletivo e transcendental, que o indivíduo
inserido num grupo social, permitiu-se assimilar? Ou seja, um fato social total na tríade (aqui
aristotélica) A eficácia simbólica/O
feiticeiro/sua magia.
***
Duas
práticas mágicas atuam numa mesma sociedade, a sociedade capitalista
multicultural, com suas ramificações. Tanto na macumba quanto nas religiões cristãs, existem diferenças internas.
Nas duas há a liberdade de, após um tempo de iniciado nas práticas religiosas,
o iniciado pode abrir seu próprio espaço religioso. Nas religiões cristãs não
há data definida, mas um código de assimilação da liturgia, ou seja, cantos,
rezas e mimeses corpóreas, além dos mitos relativos aos rituais e explicação
sígnica do mundo. Nas religiões de matrizes africanas, salvo algumas raras
exceções, o tempo mínimo é de sete anos, pois após esse tempo, o iniciado faz a
sua primeira obrigação. Um ritual de
aniversário seguido de um ritual restrito aos iniciados, feita a obrigação, o
individuo pode abrir seu próprio Terreiro.
Já no caso dum médico, para ser iniciado ele passa por uma graduação em
medicina de quatro ou cinco anos e passa por um tempo de treinamento quanto à
aplicação das práticas de cura e “expurga” dores, esse tempo é chamado residência.
É
provado que tanto os rituais mágicos de tradição europeia, africanas e
indígenas, quanto os meios científicos dos médicos, curam, porém, há um ponto de
intersecção das três práticas. Tanto na prática mágica quanto na cientifica,
esse ponto de intersecção está no campo psicológico dos dois atores,
médico/paciente ou xamã/paciente.
A
figura do médico ou do xamã traz
tanto uma expectativa de cura quanto o conforto trazido pela esperança, esse duplo psíquico, pode ativar uma tremenda
ação fisiológica que traz a cura ao doente ou ameniza a dor. Não é só o remédio
que cura, mas o acreditar que tanto o
xamã quanto o médico, dependendo da sociedade, pode curar, também cura. Há uma
intersecção do material e o transcendental (visível e invisível) que realiza a
cura.
A
semelhança entre esses dois tipos de provisão,
está na figura. A figura do médico ou do xamã traz em si uma série de significados tradicionais contidos
dentro de uma sociedade, que, no momento que entra em conjunção com o
indivíduo, após as suas práticas ou, ritual, dentro de uma margem de erros,
acontece o fenômeno.
A
figura associada a uma série de significados é muito significante dentro de uma
sociedade. Todos da sociedade ocidental eurocêntrica acreditam que, ao ir ao
médico, obterá a cura. Todos sabem que o médico pode errar, porém, ninguém
acredita que errará no momento que estará a realizar seu empreendimento, salvo
em sociedades que esse “xamã
euro-ocidental” está em descrédito pelo fato de que a maior parte de seus
empreendimentos não surtira resultado; da mesma forma que um xamã a partir do momento que seu
empreendimento não surtir resultados, este é excluído do grupo e passa a ser
motivo chacota no meio social em que este fora inserido.
Excluído
do meio social onde além de relações sociais e afetivas, fazia relações
econômicas, retirado do principal meio de sua sobrevivência, há relatos de que
chegam muitos a loucura e a morte.
Tanto
médico quanto xamã traz em si uma força que vem do inconsciente coletivo,
que no momento do empreendimento, a união do visível e do invisível, pode realizar
a cura.
***
Na
universalidade das relações econômicas do mundo capitalista, a necessidade de
convívio de muitas forças de trabalho dentro de uma sociedade com unidade
econômica, colocou em conflito diversas culturas, assim, foi necessária a
criação de um pensamento inclusivo e de aceitação do diferente. Nesse ambiente
conturbado que de um lado há as práticas do sagrado com seus procedimentos
mágicos e de outro, as práticas cientificas da medicina, coloca em conflito o
médico (como representante da cura mediante procedimentos científicos) e as
procedimentos mágicos nos povos descendentes culturalmente de europeus ou
adeptos das tradições africanas ou ameríndias. Porém, talvez, como necessidade
natural do indivíduo numa imersão em práticas e criação de mitos que expliquem
o inexplicável, cria-se, mesmo no meio “civilizado” com pensamento científico,
práticas transcendentais. Nessas práticas, o homem encarna seres e elementos
metafísicos que são materializados no corpo do indivíduo em roupas, sons e
mimeses corpóreas, além de lançar mão de uma série de utensílios e ervas que o
meio social e religioso tem como sagrados.
Nesse ambiente, nasce no inconsciente, um querer poder fazer que, o indivíduo acredita que pode realizar atos
além das leis da natureza.
Mas,
há um ponto de conjunção tanto nos meios civilizados quanto nos primitivos,
esse ponto é a mente humana que com os mesmos mecanismos, chega diversos fins.
Nessa relação com o concreto, o Homem
tem das mais variadas respostas, ou mitos, as quais podem ser estranhas para uma
cultura e natural para outra. Dessa forma, pode-se concluir que a sociedade é
um emaranhado de significantes que, a partir das relações sociais, criam-se diferentes
significados que depende dum fato social total, ou seja, a forma que o
individuo assimila todos os signos de uma cultura no momento que ele está
inserido numa determinada sociedade. Tanto o mago/xamã e suas praticas é
resultante de significados que ativam a crença coletiva, quanto a medicina é
resultado do simbólico, assim tem-se a crença na figura do médico.
A sociedade humana é composta por muitos bichos estranhos,
cabe a nós intelectuais tentar, com nossa limitada capacidade de síntese,
explicar, em fim... significados!
Bibliografia
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LÉVI-STRAUSS, Claude, O pensamento selvagem p.p. 07-49. Tradução
de Tânia Pellegrini -
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Imagem: http://www.google.com.br/imgres?hl=pt-BR&biw=1024&bih=509&tbm=isch&tbnid=reVyaiWML1vUWM:&imgrefurl=http://tudosobrecdc.blogspot.com/2008/02/marcelo-vai-se-salvar.html&docid=GNIf35zRdHjupM&imgurl=https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjGsXJmsjt1mPGYcLeaGyW4fo8duf91w5XHqsv6fH8ofXfFExcvvaugvPebdIYMJZyIqSNNxbIco_g_upDdl22ixnlHdYzUYzWZdhCThdrmRS8xdjVVKHfZZo8Wv-WMqp8VUhygwKF_dsU/s400/poder%252Bdo%252Bamor.JPG&w=399&h=297&ei=z-7pT-mfFOj50gGKvrGSDQ&zoom=1&iact=hc&vpx=196&vpy=100&dur=1856&hovh=194&hovw=260&tx=126&ty=93&sig=100074990258471430761&page=1&tbnh=133&tbnw=169&start=0&ndsp=12&ved=1t:429,r:7,s:0,i:156
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